Fundada em 1947, a Barbearia
Elegante vai fechar as portas...
2013. A barbearia localizada
quase na esquina da Jerônimo Coelho com a Borges era (ou ainda é) um pedacinho
do passado, no centro de Porto Alegre. A aposentadoria, depois de mais de 60
anos, deve ser um sinal dos novos tempos. Os barbeiros que não irão "guardar
na gaveta suas navalhas", vão migrar para outras barbearias e salões ainda
vivas.
"Oh, fica com o meu
cartão". - disse o meu barbeiro - "Vou estar agora ali na travessa,
perto da saída do cinema". Ali já não é mais exatamente a saída do cinema.
O cinema já fechou praticamente - uma ou duas salas permanecem apenas.
Foto: Instagram - Roberta Malta (http://instagram.com/p/Y5ZFVCCqUN/) |
Os cinemas eram sucesso em 1947,
quando a barbearia abriu. Nos cartazes provavelmente estavam
"Copacabana" - com Groucho
Marx e Carmen Miranda - e “Tarzan e a Caçadora”. Era pós guerra; os Aliados
haviam vencido o Eixo dois anos antes. A geração "baby boom" iria
cortar seus cabelos por ali. Na rua, em frente, deviam passar ou estar
estacionados alguns Ford Mercury, Simca's e Chevrolet's. Talvez movidos à
gasogênio - já que a gasolina estava em falta.
Em 1950' os bondes deviam rodar
pelas ruas. "Subir no bonde, descer correndo". Eram os "Anos
Dourados". O DNA era descoberto naqueles tempos. Uruguai ganhou a Copa de
50, mas o Brasil levou a de 1958 - a primeira! O clima ainda era de pós-guerra;
geração Beat se formava, principalmente nos Estados Unidos. Na barbearia deviam
entrar jovens usando jeans para aparar seus topetes.
Em 1968, quando a barbearia foi
assumida por Ilson Schambeck, nos cinemas estava sendo lançado o clássico
"2001: Uma Odisséia no Espaço". Nas rádios tocava "Se Você
Pensa", do Roberto Carlos; a Jovem Guarda ainda reinava. Nas ruas deviam
rodar alguns já velhos Cadillac's, Belair's e Ford's Victoria; talvez alguns
DKW, Fuscas, Romi-Isettas e Gordinis recém saídos de fábrica. "Sessenta e
oito, um mau tempo talvez"; fora do Brasil acontecia a Guerra do Vietnã.
A década de 1970 passou sob
ditadura. Um "Porto não muito
alegre". O "milagre brasileiro" acontecia; e a censura da mídia
ao mesmo tempo. Ali pertinho, na esquina democrática, alguns protestos devem
ter acontecido; torturas e violência policial ao mesmo tempo. Mas, "Deu
pra ti anos 70"; alguns hippies devem ter aparado suas madeixas por lá.
Os anos 1980 foram talvez a
"Belle Époque" do rock gaúcho; Engenheiros do Hawaii, TNT,
Taranatiriça, Cascavelletes. Nas ruas protestos novamente; Diretas Já e fim da
ditadura militar. No fim da década caía o Muro de Berlin.
Em 1990' o salão já era antigo. A
revolução digital ia iniciando; no salão velhas cadeiras. Os anos 2000'
passaram também; os barbeiros lá liam seus jornais. 2010' entrou; o salão havia
reduzido de tamanho e o filho do barbeiro fundou um bistrô ao lado da
barbearia.
A barbearia estava toda
reformada, sem perder o estilo mais que clássico. A navalha estava sempre
afiada - e eu confiava totalmente nas mãos dos velhos barbeiros. Terei de
buscar outro túnel do tempo. Talvez ali perto da saída do cinema – enquanto
este também ainda estiver por lá.
Entrando na Barbearia Elegante eu
viajava para as décadas de 1970, 60, 50... juro que as vezes eu via um velho
Ford passando na rua.
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