8 de jun. de 2018

A navalha

   Largou a navalha sobre a bancada. O movimento estava fraco nos últimos dias. Atualmente eram poucos homens que procuravam os tradicionais barbeiros para aparar o cabelo e afeitar a barba. "Deve ser culpa dos shoppings" - pensava.
   Diariamente a barbearia era aberta. Pontualmente, as 8:30. O jornal do dia, comprado na banca próxima, era depositado em uma das tradicionais cadeiras; a Playboy do mês, sobre outra; o branco jaleco era vestido. E a navalha era afiada - sem pressa, com esmero.
   Haviam dias em que a navalha sequer era utilizada, independente disto, no fim do dia era guardada na gaveta e afiada novamente no dia seguinte - sendo mais uma vez colocada sobre a bancada.
   O calor dos últimos dias devia estar espantando os clientes. Assim como o frio de alguns meses atrás.
   "E o jogo de ontem?", "Será que chove?!", "Roubalheira nessa política!" - citavam os passantes e os poucos cativos clientes.
   O tempo passava. As pessoas passavam. O chão era varrido, recolhendo os fios caídos. O sol baixava. E a navalha era limpa e guardada na gaveta.
   No dia seguinte a barbearia era aberta. 8:30. Jornal do dia sobre uma cadeira. Playboy sobre outra. Jaleco Branco. E a navalha era retirada da gaveta e afiada - sem pressa, com muito esmero.
      "E o jogo?", "Chove?!", "Roubalheira!".

   Com o sol baixando, o chão era varrido. A navalha pairava sobre a bancada. Logo voltaria para a gaveta, até a próxima manhã.
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